O ombro da Borboleta

O ombro da Borboleta

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

O canto do mar

Sentiu-se frio.
Esquecera da cor das paredes, dos ímãs da geladeira. Não se lembra dos quadros, nem dos lençóis. Não consegue recordar os livros... os livros! Alguns arriscavam sair da memória...sobre vinho, talvez? A estante antes tão conhecida se dissipa, tristemente desvanece.
Ah, a saudade. E o tempo destruindo os últimos vestígios da sua presença.
Fechou os olhos. Percorreu por entre os momentos, distantes, remotos, relutantes.
Era como olhar um álbum antigo. Fotos quase apagadas, com sombras, borrões e cores invertidas.
Deteve-se em uma, observou-a. Apertou os olhos e esperançosamente, lá estava ela.
Cabelos negros, lisos, o olhar profundo. Quase como um reencontro, ele sorriu.
Quantas coisas se passaram! Quanto para dividir!
Um carinho, um afeto lhe afagou o peito. Seu rosto, seus lábios, agora tão reais. Tocá-los é o afastamento.
Tudo é apenas uma lembrança. Esse encontro inócuo é também deliberadamente improvável.
Continentes de contos os separam. Ele sabe. Mas sonha.
E sente o afoguear com deleite. Esse formigamento doce, como um aviso inesperado de chegada.
É seu jeito de roubar esse amor, como se fosse desde sempre seu, e só seu.
Como se a ninguém ela pudesse amar tanto.
Suspira, e está seguro, por mais um tempo, de deixar lavar as águas, a memória-relíquia da sua história mais viva.

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